Comediante alemã Lea Maria expõe racismo sofrido por seu produtor durante visita a Santa Catarina

03/11/2023

Capa - Cred Reprodução Instagram

Atualizado em 9/11/2023 - 17h35

A comediante Lea Maria, a “alemã tropical”, esteve no estado de Santa Catarina para conferir de perto algumas celebrações do Oktoberfest, assim como realizar alguns dos seus shows.

A humorista, que nasceu, cresceu e estudou na Alemanha, vive no Brasil há mais de 5 anos e criticou atitudes inaceitáveis que presenciou durante sua visita ao estado catarinense. 

Lea denunciou ataques racistas direcionados a seu produtor, assim como comentários relacionados sobre em qual campo de concentração ela havia o encontrado, durante uma de suas apresentações na cidade de Jaraguá do Sul. 

"Eu sou alemã. Eu nasci, cresci e estudei na Alemanha. A importância da prevenção do racismo é até registrada na língua. “Vergangenheits-bewältigung” é uma palavra composta, que descreve “lidar com o passado” ou “reconciliação com o passado”. Essa prevenção acontece nas aulas de história, assim como em uma visita em um campo de concentração ou de trabalho. Temos leis e regulamentações para essa história nunca mais acontecer", disse ela em um vídeo postado em seu perfil oficial no Instagram, falando sobre as atitudes imperdoáveis e sobre como isso é um crime hediondo, uma vez que lá, a prevenção do racismo é registrada até na língua.

Confira o relato completo: 

“Eu fui no Oktoberfest aqui do Brasil pela primeira vez, em Blumenau, fui super recebida pelo Bonde do Pato. Vendo as pessoas falando alemão, cantando músicas alemãs, que não ouvia há mais de 10 anos, realmente me deixou me sentindo em casa. 

Nas viagens que faço, eu falo com humor sobre as diferenças culturais e como essas diferenças nos fazem únicos. Em 2 dos 4 locais que eu visitei, eu presenciei o meu produtor sofrer injúria racial, que inclusive denunciamos. 

Em Jaraguá do Sul, em devido momento que tiramos fotos com os fãs, uma das pessoas presentes veio me perguntar em que campo de concentração eu havia achado meu produtor. 

E o mais absurdo é que isso não foi um caso isolado na nossa viagem. Essa pessoa depois veio se desculpar comigo, em vez de falar com o meu produtor, que sofreu a injúria.

Eu sou alemã. Eu nasci, cresci e estudei na Alemanha. A importância da prevenção do racismo é até registrada na língua. “Vergangenheits-bewältigung” é uma palavra composta, que descreve “lidar com o passado” ou “reconciliação com o passado”. Essa prevenção acontece nas aulas de história, assim como em uma visita em um campo de concentração ou de trabalho. Temos leis e regulamentações para essa história nunca mais acontecer. 

Comentários como esse de Jaraguá do Sul são considerados crimes hediondos.

Queria postar esse vídeo para mostrar que esse tipo de comportamento faz parte de uma ideologia que eu não tolero. Injúria racial é crime e tem que ser tratado assim. 

Eu sei que o combate ao racismo e ao preconceito tem sim sua devida importância para os organizadores do evento e para todo o povo catarinense. Mas, esse vídeo como sempre foi somente um resumo da minha viagem, do que eu vivenciei, um alerta para situações vivenciadas por meu produtor e um lembrete para nós, enquanto sociedade, que devemos preservar tradições e culturas, mas que as intolerâncias e preconceitos, devem ser deixados no passado.

Eu queria mais uma vez agradecer a todo mundo que me acompanha, que vem nos meus shows, que me apoia. Muito obrigado”

De acordo os dados divulgados no relatório Observatório Judaico de Direitos Humanos, Blumenau, em Santa Catarina, é a segunda cidade com maior número de células neonazistas no Brasil, ficando atrás apenas de São Paulo. Curitiba é a terceira colocada. O estado de Santa Catarina ainda foi o que mais votou em Jair Bolsonaro, que, por inúmeras vezes, chocou o Brasil e o mundo com suas falas racistas, misóginas e homofóbicas, indignas de qualquer ser humano, muito menos de um que representava, ou deveria representar, a Presidência da República. 

Confira o vídeo de Lea Maria na íntegra:

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

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A assessoria de imprensa da Oktoberfest, de Blumenau, entrou em contato com o Stereo Pop para esclarecer que o ataque racista não ocorreu durante a festividade, mas sim em uma cidade localizada a cerca de 65 km, em Jaraguá do Sul. 

O produtor de Lea Maria, Lyo, também postou um vídeo em sua rede social falando sobre o caso, que ocorreu no dia 20 de outubro de 2023, durante a segunda sessão do show de stand-up da humorista.

"Lea Maria, em qual campo de concentração você encontrou esse menino aí? E aí todo mundo ficou em silêncio, porque foi um choque. Não contente, essa pessoa ainda foi tentar se justificar e foi fazer referência a um filme e virou e falou assim: Não, eu tô falando daquele filme "O Menino do Pijama Listrado", por causa da roupa. E eu tava com a roupa listrada no dia e ela fez menção a um filme que tem crianças morrendo na câmara de gás  nazista, um filme que fala sobre nazismo, que perseguiu judeus, pretos, homossexuais, que promoveu o verdadeiro Holocausto neste planeta.

Não contente ainda. Depois de falar tudo isso. Ela chega para a Lea Maria no final do show, aborda ela e fala assim: "Lea, eu queria te pedir desculpas se a minha piada te ofendeu". 

Em nenhum momento ela veio falar comigo. Em nenhum momento ela trocou olhares comigo. Em nenhum momento ela dirigiu a palavra a mim. É como se eu fosse o que? O preto de estimação da Lea?

A gente tá em 2023, gente. Não estamos em 1950.QUando é que isso vai parar? Quando é que a gente vai poder ter oportunidade como todo mundo? Quando é que a gente vai ser tratado como todo mundo?

É um absurdo ter que sair de casa para trabalhar e me deparar com uma situação dessa, entendeu? Onde em cumpro um contrato e eu não posso nem expressar a minha revolta. Que não é só minha não, tá? É de todo mundo. É de todo preto, de todo homossexual, de todo aquele que se sente menosprezado, diminuído, humilhado. Isso tem que parar, gente.

Eu vim dar voz e colocar minha cara aqui, porque se precisa de uma cara, tá aqui. Eu não tenho medo. Eu não tenho medo porque eu tenho fé. Ela me traz consciência para que eu possa continuar a minha caminhada, porque eu sei qual é o meu propósito aqui. Falar o que precisa ser falado, fazer o que precisa ser feito, pra que esse tipo de situação não aconteça mais. 

A gente já tomou todas as providências legais. Existe um boletim de ocorrência feito na delegacia de Jaraguá do Sul, e eu vim aqui pedir por favor para que vocês possam me ajudar a dar voz a esse caso. Porque eu acredito que não tenho força sozinho para conseguir dar a voz que essa situação precisa, porque foram crimes hediondos., o que aconteceu em Jaraguá do Sul no dia 20 de outubro de 2023. E isso não pode mais passar batido e nem ser levado como piada, porque uma fala que humilha, uma fala que rebaixa, uma fala que mata muita gente, mata crianças, mata minorias, todas elas. Até quando a gente vai assistir isso? Até quando a gente vai passar pano pra isso? Até quando a gente vai continuar com esse discurso de ódio. "

Confira o relato completo: 

 

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

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